O TEMPO DA IMAGEM: FOTOGRAFIA E MEMÓRIA
Quando olhamos para uma fotografia, principalmente quando esta é impressa, automaticamente voltamos no tempo espaço. É como se, de certo modo, a fotografia tivesse a possibilidade de nos transportar para uma memória afetiva para qual um dia não demos importância, mas que neste momento torna-se maravilhosamente especial.
Talvez, inclusive, seja porque não demos importância no momento da foto, no tempo que naquele instante era o nosso presente. Seria uma espécie de culpa que carregamos de não ter aproveitado aquele tempo que nos causa essa nostalgia? Muitas vezes, com a dificuldade de vivermos no presente, acabamos não valorizando o que temos e ressaltamos muito o que não temos. Contudo, aprenda a se perdoar, pois nós não aprendemos muitas coisas durante o tempo em que vivemos. E, naquele tempo, você era outra pessoa e, por isso, não poderia pensar do mesmo modo que hoje. Então, arrepender-se é positivo e tudo bem se você errar. Mas aprenda também a se perdoar. E sinta o quanto é gostoso parar para olhar o espaço-tempo. Podemos conjecturar que esse resgate à memória é que tornou fotografia tão especial. Quando tiramos uma foto, pretendemos guardar um momento, que, geralmente, está sendo especial e/ou marcante para nós.
Antes da fotografia existir, era comum que fossem solicitados pelos nobres e pelos burgueses um autorretrato. Entretanto, por mais realista que seja uma pintura, ela apresenta duas diferenças cruciais para ser substituída pela fotografia:
1) O tempo extenso que leva para ser produzida (e pensemos que a fotografia foi criada em plena era das máquinas, quando a velocidade dos meios de produção era parte de uma nova era);
2)Por mais realista que seja uma pintura, ela nunca apresentará a sensação de congelar um momento com tamanha fidedignidade. É realmente impressionante a invenção das máquinas fotográficas!
Mais impressionante ainda é a mudança de função social da fotografia ao longo dos anos. Não só as máquinas evoluíram, – tornando-se cada vez mais rápidas e apresentando melhor qualidade de imagem -, como também a função dela se modificou abruptamente, ampliando-a como uma forma de linguagem e de comunicação sem o uso das palavras.
Se outrora escrevíamos muito, agora mostramos. Você não vai escrever no seu Facebook (acho, pois me parece que esta prática está diminuindo), por exemplo, que encontrou um pombo morto em frente à saída do prédio ou da casa onde você mora. Você, digo em geral, há alguém que vai. Mas acredito que grande parte não o fará. E por dois bons motivos:
1º) Provavelmente, você está de saída para algum compromisso. E, diante do pouco tempo que tem, vai ser mais rápido tirar uma foto se quiser muito compartilhar isso.
2º) Trata-se de uma imagem chocante que resultaria muitos likes no Instagram (cujas imagens são predominantes).
Não posso deixar de criticar as pessoas que, nesta situação, publicariam a horrenda foto da ave defunta com a seguinte mensagem: “Bom dia!”, ou “Bom dia aos que estão vivos“, ou ainda: “Esta foi a minha primeira visão do dia assim que abri a porta da rua. Bom dia a todos!”
Confesso que, nesses momentos, odeio a fotografia! Mas, em seguida, sempre penso nas inúmeras invenções criadas para o bem, construídas por esforços oriundos de um grande sonho, mas que foram usadas para um fim cruel. A criação do avião, por exemplo, foi parte de um grande sonho de Santos Dumont: voar. Contudo, quando finalmente realizou o seu sonho, construíram diversas máquinas voadoras para atirar bombas em cidadãos de países inimigos da França. O desgosto do brasileiro e a culpa levaram-no ao suicídio.
Nessas horas, é preciso separarmos o instrumento inventado dos seus consumidores. Afinal, na sociedade capitalista, é preciso aceitar a realidade do poder e entender-se como parte desse sistema, independentemente de sua vontade. Esperar o contrário soa, inclusive, ingênuo.
Além disso, precisamos pensar nos diferentes ângulos de visão possíveis em todas as situações. A própria fotografia muda conforme o ângulo de onde se tira a foto e conforme a luz, o aparelho, etc. Algumas pessoas se saem bem em qualquer posição nas fotos em que aparecem. Outras saem melhor de perfil ou de meio perfil. Assim sendo, – e não comento como um julgamento, mas como um convite à reflexão -, haveria outros modos de Dumont pensar.
Por exemplo, se ele imaginasse o benefício atual dos aviões para a comunicação e para o deslocamento das pessoas em menos tempo como um milagre e como a maior evolução de todos os tempos, talvez não tirasse a própria vida. Os aviões, atualmente, são primordiais para a nossa sociedade globalizada. Quem diria? Mas, será que nosso grande inventor pensou nisso? Acredito que não.
Santos Dumont foi quase um Santo nesse sentido, pois voar era quase um milagre para a humanidade. Mas ele mesmo desacreditou de si e de sua obra quando soube da ação de bombardeios de inocentes em meio à guerra. Talvez, se imaginasse o quanto contribuiu para a nossa evolução, teria presenciado um pouco disso. Voar foi chegar onde nossa espécie nunca sonhou.
Do mesmo modo, preciso buscar outras formas de ver essas fotos que não me agradam. Até porque, como já pontuei, diante da rapidez na comunicação, em que há cada vez menos tolerância à espera pelas respostas de mensagens, não é possível sempre usar as palavras para dizer o que queremos. Nesse sentido, portanto, a imagem fotográfica se tornou linguagem. E, consequentemente, mais rapidamente acessível e primordial para a rapidez exigida na comunicação dos dias atuais.
Assim sendo, adquira agora mesmo a sua câmera, guarde suas memórias e faça um álbum de emoções com os produtos da World View, pois mais do que uma foto, oferecemos a possibilidade de você resgatar parte do espaço-tempo da sua vida.